Nos termos do art. 182, caput, da Constituição Federal, incumbe aos municípios, mediante os diversos instrumentos jurídicos previstos em lei, a execução da política urbana com o escopo de ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.
A desapropriação de imóveis urbanos estampada no art. 182, § 3º, da Constituição se insere precisamente no contexto do aprimoramento da política de ordenamento municipal, porquanto outorga aos entes locais a prerrogativa de incorporar, de maneira compulsória, imóveis privados ao patrimônio estatal para permitir sua posterior afetação ao desenvolvimento de projetos e programas eleitos pelos atores políticos como essenciais para as respectivas comunidades.
Além disso, conquanto a desapropriação implique transferência cogente de bens privados ao domínio público, atribui-se aos expropriados o direito fundamental ao percebimento de prévia e justa indenização em dinheiro com o objetivo de compensar os prejuízos individuais suportados em benefício da coletividade.
No entanto, a despeito dos mandamentos constitucionais condicionando a validade da expropriação de bens particulares ao pagamento de prévia compensação financeira, não são desconhecidos casos de declaração de utilidade pública expedidos por entes municipais sem a devida reflexão acerca dos respectivos impactos nas finanças públicas, contexto que propicia o desequilíbrio orçamentário-financeiro do expropriante em decorrência da necessária reserva de vultosos valores ao pagamento das indenizações e, de outra parte, priva os expropriados do recebimento tempestivo da reparação econômica pela perda forçada da propriedade.
Nesse contexto, buscando equacionar o descompasso entre a normatividade constitucional e a realidade empírica, o art. 16, caput, I e II, e § 4º, II, da Lei de Responsabilidade Fiscal passou a condicionar a validade das desapropriações de imóveis urbanos à prévia estimativa do impacto orçamentário-financeiro, bem como à declaração de compatibilidade das despesas necessárias ao pagamento das indenizações ao disposto no plano plurianual, na lei de diretrizes orçamentárias e na lei orçamentária anual.
Tal regramento, além de estabelecer requisitos essenciais à regularidade das expropriações, tem por escopo, sob o prisma da responsabilidade na gestão fiscal, garantir a cobertura das despesas a serem suportadas pelos municípios mediante comprovação da existência de créditos suficientes ao custeio das indenizações, além de atribuir responsabilidades aos ordenadores de despesas caso apurada a incompatibilidade entre os gastos decorrentes da expansão da ação governamental e as leis orçamentárias.
Outrossim, como o inciso II do § 4º do art. 16 da LRF estabelece que o cumprimento do requisitos do caput do dispositivo consiste em condição prévia à desapropriação de imóveis urbanos, a verificação do atendimento a suas disposições deve ser aferida em momento anterior ao ajuizamento de ações expropriatórias, porquanto após a expedição do ato declaratório de utilidade pública incumbe à Administração avaliar os bens a serem incorporados ao patrimônio público para quantificar o valor reputado devido a título de justa indenização.
Isso porque a avaliação empreendida pelo poder público constitui fase necessária à verificação da proposta de compensação financeira a ser apresentada ao particular e, uma vez apurado tal montante, é possível estimar o impacto orçamentário-financeiro da desapropriação e examinar a adequação das despesas necessárias ao pagamento da indenização ao disposto nas leis orçamentárias, razão pela qual essas providências devem anteceder a proposta oferecida pelo expropriante em sede administrativa ou judicial.
Do mesmo modo, a análise antecipada das repercussões dos atos expropriatórios sobre as finanças públicas vai ao encontro dos deveres de responsabilidade e de planejamento na gestão fiscal estampados no art. 1º, § 1º, da Lei Complementar n. 101/2000, os quais objetivam afastar os riscos e corrigir desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas e, por isso, demandam atuação preventiva voltada a debelar eventuais efeitos nocivos decorrentes de despesas cuja execução não se compatibiliza com as leis orçamentárias.
Dessarte, a adequação formal da ação de desapropriação de imóveis para o desenvolvimento da política urbana é vinculada à prévia observância das exigências previstas no art. 16, caput e § 4º, II, da LRF, cujo descumprimento, a par de invalidar o ato expropriatório, implica a irregularidade das despesas e lesividade ao patrimônio público (art. 15 da LRF), tratando-se, portanto, de formalidade específica da petição inicial das respectivas ações expropriatórias que se soma às disposições gerais arroladas no Decreto-Lei n. 3.365/1941 e no CPC/2015, as quais convivem harmonicamente e devem ser comprovadas pela Administração Pública ao ajuizar a demanda.
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